VERBETES:
Angelo Trento (L’Università degli Studi di Napoli L’Orientale)
A imprensa antifascista italiana no Brasil
Publicado em 06/09/2016
A imprensa antifascista italiana foi publicada no Brasil entre os anos de 1922 e 1936. Representou um fenômeno minoritário se comparado com os numerosos periódicos de fé fascista que circularam dentro da colônia e que refletiam claramente a simpatia que o regime totalitário de Roma despertou entre os imigrados, em parte por causa do prestígio adquirido por Mussolini no panorama internacional.
Apesar disso, nasceram vinte e um títulos antifascistas (dezoito em São Paulo, dois no Rio e um em Poços de Caldas), quase sempre de vida breve ou brevíssima, sobre os quais, às vezes, temos conhecimento apenas por meio de citações em fontes secundárias e dos quais não encontramos nenhum exemplar, destino, esse último, que quase atingiu também o carioca Il Popolo d’Italia. Apesar de ter circulado de 1918 até pelo menos 1934, sobrou apenas um número de 1923 e de cuja natureza antifascista temos notícia somente através de informações enviadas a Roma pelo consulado.
Existem, porém, quatro importantes exceções: três periódicos que duraram dois anos (Il Risorgimento, Lo Spaghetto e Italia Libera) e o mais importante órgão do movimento antifascista, La Difesa, que circulou de 1923 a 1934 e cujos 518 números são praticamente todos consultáveis, em suas edições quinzenais, hebdomadárias, bihebdomadárias ou mesmo diárias, estas restritas a somente três meses. Entretanto, a maioria desses cabeçalhos teve periodicidade semanal ou de forma decididamente irregular. A norma era representada por publicações de quatro páginas, mas era possível encontrar, ainda que raramente, edições que chegavam a oito e revistas de dezesseis páginas, como Il Risorgimento no seu primeiro ano, ou até a sessenta e duas, como o número único Almanacco Antifascista pel 1929.
Sempre constrangida por dificuldades financeiras – que tentava contornar com contribuições voluntárias de seus leitores, com propaganda comercial principalmente de conterrâneos, com campanhas de assinatura e, em alguns casos, com a ajuda das lojas maçônicas italianas no Brasil –, essa imprensa propunha-se basicamente a contrainformar aos imigrados, mas principalmente também à opinião pública brasileira sobre a real situação da Itália e a verdadeira natureza do fascismo, com suas violências, falsidades e misérias.
Essa função prioritária levava, logicamente, a fazer com que a maioria dos artigos e das colunas falassem da Itália, mas também dos fascistas italianos no Brasil e das estruturas partidárias do regime para aqui transplantadas, de seus métodos brutais voltados para o total controle da colônia graças à adesão das elites que dirigiam as associações étnicas a Mussolini, da imprensa em idioma italiano e de um corpo diplomático que abdicara de suas atribuições institucionais para tornar-se simples instrumento de propaganda do Regime, todos elementos que, entre outras coisas, levavam a alertar os brasileiros acerca do perigo que os fascistas representavam para sua soberania nacional.
Bem menor espaço era reservado aos acontecimentos internacionais e eram deixados de lado os próprios assuntos do país que os acolhia, salvo alguma incursão em temáticas econômicas, ao menos até a Revolução de 1930 a qual induziu os inimigos de Mussolini a manifestar simpatias e interesse pela nova situação. Numerosas eram, obviamente, as notícias sobre o antifascismo, mas a partir de 1928 isto significou tornar visíveis as fortes divisões que o abalavam no Brasil e alhures, que se refletiam inclusive na imprensa, em que uma frente de socialistas moderados, republicanos e antifascistas sem partido contrapunha-se a outra de socialistas mais radicais, comunistas e até mesmo anarquistas.
De qualquer forma, desde 1930 esses jornais assumiram uma atitude mais transnacional e ambas as tendências estabeleceram relações mais firmes com o movimento operário e o antifascismo brasileiros. A partir de 1932, porém, esses periódicos começaram a se enfraquecer até desaparecerem totalmente na segunda metade da década de 30, justamente quando passa a vigorar o Estado Novo.
Imagem 01: La Difesa (1923-34): o mais importante e longevo jornal do antifascismo de São Paulo.
Imagem 02: Itália Libera (1930-31): quinzenal paulistano que foi dirigido por Pasquale Petraccone.
Imagem 03: Lo Spaghetto (1931): hebdomadário paulistano que foi dirigido por Nino Daniele e Alessandro Cerchiai, que tinha posições diferentes de La Difesa.
Referências
TRENTO, Angelo. Do outro lado do Atlântico: um século de imigração italiana no Brasil. São Paulo: Nobel, 1989.
TRENTO, Angelo. Imprensa Italiana no Brasil: séculos XIX e XX. São Carlos: Ed. UFSCar, 2013.
BERTONHA, João Fábio. Sob a Sombra de Mussolini: os italianos de São Paulo e a luta contra o fascismo, 1919-1945. São Paulo: Annablume/FAPESP, 1999.
Para citar este artigo:
TRENTO, Angelo. A imprensa antifascista italiana no Brasil. In Site TRANFOPRESS Brasil, disponível em: <transfopressbrasil.franca.unesp.br/verbetes/a-imprensa-antifascista-italiana-no-brasil/>